O Taekwondo é considerado por uns um desporto, por outros uma arte marcial. Principalmente neste caso, na vertente marcial, existe uma interpretação do Tae kwon do como filosofia de vida. Um modo de estar. É sobre esta visão do Tae kwon do que me pretendo debruçar.
A expressão “filosofia de vida” não é de fácil interpretação. Na realidade, o que é filosofia? Etmologicamente a palavra é de origem grega e significa “amor à sabedoria”, mas também elevação de espirito, grandeza de alma, conhecimento.
Assim, uma filosofia de vida, é uma interpretação da vida de um modo muito próprio, assente em principios e valores muito precisos e que tem um significado muito importante para quem os vive. È a busca do conhecimento, ao longo da vida, baseada em determinados valores.
Assumir o TAE KWON DO como filosofia de vida, é assumir um modo de encarar as vitórias e as vississitudes com um espírito frontal e positivo.
No entanto, enquanto para os povos orientais a interpretação destes principios é relativamente fácil, pois está enraizado nas suas culturas, para um normal cidadão ocidental, interpretar tais principios à luz da sociedade actual torna-se bastante mais exigente.
A filosofia do Tae kwon do baseia-se em valores culturais próprios do povo coreano. Um povo que sempre viveu oprimido ou sobre constante ameaça de guerra (quer por quezílias internas ou por invasões estrangeiras) criou valores e principios que asentam numa base de grande união, solidariedade e respeito.
Compreender o Tae kwon do como Filosofia implica acima de tudo conhecer a Cultura Coreana e a sua História. Aspectos culturais como o significado e origem da bandeira (T’aeGuk-ki), do HanDoBok e o desenvolvimento da Península da Coreia e das artes marciais coreanas, revestem-se de vital importância para a compreensão dos valores subjacentes ao Tae kwon do.
Os princípios que regem os praticantes do Tae kwon do baseiam-se essencialmente no código de ética dos antigos guerreiros Hwarang. Se por um lado, se verificou uma actualização desse mesmo código de ética, por outro, a essência dos valores manteve-se. Lealdade, cortesia, educação, honradez, espírito indomável e sentido de justiça fazem tanto sentido hoje como na antiguidade.
Interpretar os princípios do Tae kwon do e aplicá-los no dojang, bem como na vida é um desafio que se enfrenta diariamente. Ser educado, modesto, integro, perseverante, respeitador, amigo, controlado física e emocionalmente, e apresentar um espírito guerreiro são premissas que considero vitais para se compreender o Tae kwon do como filosofia de vida.
Após alguns anos de prática, o Tae kwon do começa a fazer parte de nós. Compreendemos os benefícios que nos trás, quer física quer mentalmente. Praticamos a arte incessantemente. Treinos após treinos, praticamos as diferentes vertentes desta paixão: kibon, bal chagi, son kisool, kyorugi, poomsae, hoshinsool, il bo daerion, kyok’pa, joasun... Aperfeiçoamos a técnica e aguçamos a mente. Ganha-se um vicio, saudável e para vida.
E passado algum tempo percebe-se algo, que o Tae kwon do não é um desporto. Mas também não é uma arte. É a relação que se estabelece entre o EU e a ARTE, e o meio que o rodeia. Esta relação tripartida e recíproca é o valor essencial da filosofia do Tae kwon do. O Tae kwon do está interiorizado em nós. Já o vivemos diariamente. Podemos perder tudo o que temos na vida, do ponto de vista material, mas continuaremos sempre a ter o Tae kwon do, pois é algo que já foi assimilado, e que já faz parte da nossa personalidade. O Tae kwon do é uma relação que se estabelece com nós próprios, é uma relação de constante crescimento e desenvolvimento, e que jamais perderemos.
E deste ponto em diante, o khiap ganha um significado totalmente novo. Ganha um poder esmagador. É o libertar de uma energia interior. É o mostrar que estamos vivos. Que não estamos meramente de passagem neste mundo. É a nossa “marca”, é a nossa personalidade, umbilicalmente ligada ao Tae kwon do.
A compreensão do Tae kwon do como filosofia, passa por aprender, compreender e viver tudo o que aqui foi escrito. Compreender verdadeiramente os principios do Tae kwon do e assumi-los como nossos, viver a prática com paixão, respeitar e aplicar a simbologia da cultura Coreana, são o meio para se atingir o fim desejado... O de ser um verdadeiro taekwondoca.
Como Kyo Sa Nim, sinto que tenho uma grande responsabilidade. Ensinar a técnica e demonstrar a prática não me assusta, mas por vezes sinto dificuldade em transmitir a mensagem do verdadeiro poder do Tae kwon do, do seu real significado, pois é algo que só se atinge com a prática e com o tempo.
A mensagem que transmito prende-se muito com valores sociais. Para além dos principios do Tae kwon do, existem dois que considero fundamentais. O primeiro é a amizade entre todos os praticantes. O espírito de grupo, de equipa.
Acreditamos
Que o homem é aquilo que pensa
Que não basta saber, é preciso partilhar o que se sabe
Que não é bastante querer, é preciso saber querer em grupo
Que o que sabemos de nada vale, pois todo o valor reside naquilo que
Fazemos com o que sabemos…
(Clube de Taekwondo de Portimão)
Na realidade, uma das simbologias do Tae kwon do, presente em muitos emblemas (os antigos KWAN, KTA, FPT, p.ex.) , é o punho cerrado (kwon). Representa não só um dos significados da arte marcial (ataques com punho), mas também os 5 principios do Tae kwon do (os 5 dedos) e a união entre os praticantes (um punho fechado é mais forte que uma mão aberta).
O segundo é a atitude. É o espírito aplicado à prática. Todas as vertentes da arte devem ser executadas com espirito, com um khiap vigoroso e sincero. No Tae kwon do, bem como na vida, devemos viver com atitude, sem medos e sem receios. Porque uma vida sem atitude e sem espírito é uma vida vazia, e o Tae kwon do é o caminho para nos descobrir-mos a nós próprios.
...aquele que conhece o inimigo e a si mesmo, lutará cem batalhas sem perigo de derrota;
para aquele que não conhece o inimigo, mas conhece a si mesmo, as hipóteses para a vitória ou para a derrota serão iguais;
aquele que não conhece nem o inimigo e nem a si próprio, será derrotado em todas as batalhas...
SUN TZU – “ A ARTE DA GUERRA”
Tiago Carito (Tese para 3ºDan)
30 de Março de 2008